Reflexões sobre o borderline

A rua só tem duas iluminações esta noite : os postes e a lua, absolutamente zero estrelas. Quando terminamos eu senti um senso de desespero ao pensar que caminharia pelas mesmas ruas e sob os mesmos astros sem a sua companhia, hoje não ando nem por essas ruas nem vejo esses astros. Está nublado faz semanas no meu ponto de vista.
São 21hs, o remédio faz efeito e minha mente parece feita de gelatina, os pensamentos moles e escorregadios. Pela primeira vez na minha vida toda eu não sinto revolta, e ao invés de paz isso me angustia, como se uma parte muito integral de mim mesmo tivesse sido pintada por cima por alguém sem muita habilidade artística, como se eu fosse uma versão barata do Ecce Homo. Existia um certo conforto em ser doente mental e não-medicado, como se independente do que acontecesse na minha vida eu tivesse algo com que eu poderia contar: que a certeza da miserabilidade estaria lá por mim quando ninguém mais estivesse.
O antipsicótico foi descrito uma vez como uma "Lobotomia Farmacêutica " e é exatamente assim que eu me senti nos primeiros 15 dias da medicação. Passei dos 12 aos 19 constantemente querendo me matar a ponto de isso ser o único ponto de vista pro futuro que eu tinha. No início do meu relacionamento eu já sabia que ele ia terminar porque contava meu suicídio como uma certeza.
Nunca pensei profundamente a respeito da minha identidade e papel no mundo porque tinha certeza de que iria me matar. Nunca tentei construir relações duradouras porque contava com a pouca duração da minha vida.
Passar a viver sem essa ideia constante de suicídio foi desafiador, eu me senti um cachorro sem dentes, como se algo que me definisse tivesse me sido tirado a força. De certa forma foi isso que ocorreu. Mas já se passou 1 ano que eu tomo a medicação. Cheguei a conclusões mais profundas sobre mim mesmo e como eu funciono, quem sou, o que devo fazer. Vivi experiências que honestamente nunca pensei que viveria para contar sobre. Tudo isso é muito massa.